domingo, 24 de agosto de 2014

Essa não é a vida real



Twitter, Facebook, Instagram, Blogspot. Talvez nunca tenha sido tão fácil viver uma vida paralela quanto hoje em dia.
Fotos de viagens, roupas novas, carros bonitos. Homens e mulheres querendo ser mais, querendo ter mais. O que antes vivíamos apenas nas páginas de um livro ou num filme de cinema passou a ser externado de uma maneira mais dinâmica. Nossos sonhos e desejos passaram a se misturar com a realidade e essa mistura passou a nortear nossas vidas.
Não se trata de uma aversão a tecnologia, mas sim o uso que é dado a esta. E esse uso sim vem ditando tendências e comportamentos. Quem nunca viu aquela criança de outrora, agora adolescente "sensualizando" como gostam de dizer por aí, em fotos com a língua de fora. Parece uma enxurrada, uma verdadeira legião de pessoas com a língua de fora e por quê? Porque todos fazem, simples assim.
O ser humano, de acordo com a antropologia, se desenvolveu para viver em grupos e esses grupos de humanos se desenvolveu para relacionar-se uns com os outros, trocando experiências uns com os outros. Era assim com o homem das cavernas, é assim com o homem moderno. Esse comportamento inerente ao ser humano está no cerne do que veio a se popularizar como redes sociais.
Interação rápida, quase instantânea, somada a possibilidade da associação de fotos e geo-localização disseminou a ideia de que qualquer um poderia ser mais popular, mais atraente. A ideia de nos mostrarmos cada vez mais tornou-se algo popular de modo que o importante passou a ser a questão de termos ou não conteúdo para mostrarmos.
Até mesmo a mais reclusa das pessoas tem algo a dizer, algo a mostrar. Mas e aqueles tímidos? Aqueles excluídos? Muitos destes viram uma revolução acontecer em suas vidas. De cativos de uma sociedade excludente passaram a uma liberdade jamais pensada, mas a questão não é sobre os populares e não populares e sim sobre quem consegue gerar conteúdo para ser publicado o tempo todo?
Está aí a mãe de todas as questões nesta era de conteúdo digital. Se um jornal, uma revista ou grande portal carecem de uma equipe inteira para tocar a máquina e muita das vezes apenas conseguem replicar conteúdo gerado por terceiros, como uma única pessoa conseguiria manter-se com algo relevante? Como seria possível uma única pessoa manter o nível de "like" necessário?
A resposta é simples, com mentiras, meias verdades e manipulação da realidade. É a foto de uma garrafa de vodka, energéticos e narguile em cima de uma mesa com frases como "hoje a noite promete" ou "amigos e baladas" ainda que a noite tenha terminado com uma pessoa bêbada e sozinha. É a foto daquela garota com a língua de fora tentando mostrar que já tem seios ao estufar o peito e dizer num português incrivelmente ruim "eu sei qui tu goooosta". Ainda que seja tímida e que como muitos adolescentes sofra de um amor platônico, precisa a todo custo mostrar que é descolada e que pouco se importa com sentimentos. O importante é ser "rodada e vivida", ainda que não seja.
Não se pode ser sincero o tempo todo. Os psicólogos e psiquiatras estão aí para confirmarem isso. O problema é viver uma vida que não se tem. É se logar em um site e passar a ser uma pessoa que não é. Estamos cada vez mais cultuado o mito, a imagem, e nesse caminho estamos nos perdendo. Estamos nos tornando uma sociedade de faz de conta, tão artificial quanto os bits e bytes que passamos a cultuar.

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