quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Mas ainda assim o amor acontece...


Passava das 18 horas quando ela chegou em casa. Cansada. O dia de trabalho havia sido corrido e o motorista do ônibus pouco se importava se ela queria ou não um banho quente. Aliás, o trânsito daquela segunda feira beirava o caos e também pouco se importava com ela.
Aliviada por abrir a porta de seu apartamento lembrou-se que não recordava se havia tirado o ferro de passar roupas da tomada pela manhã.
Como diz o ditado, cansaço pouco é besteira. E lá se foi ela chutando a mesinha da sala num correr desajeitado rumo a mesa de passar roupa. Um respiro aliviado seguiu-se ao pequeno trote. Mil pensamentos na cabeça: - "Pronto, lá ia eu aparecer no noticiário. A mulher do apê queimado". Sorriu com o pensamento maldoso enquanto amarrava seus cabelos num coque com um lápis que encontrou na cozinha.
Curioso saber que nos dias de hoje as pessoas ainda usam lápis para escrever. Parece cafona, da mesma forma que o elefante com as costas virada para a porta de entrada ou o tapetinho escrito "entre sorrindo", mas era inegável o charme que somado a tantos outros objetos cafonas aquele apartamento tinha.
De coque em riste, lá foi ela pôr roupa na máquina de lavar e comida no microondas para esquentar. A novela passava na tv mas pouca atenção ela conseguia dar. Perdera alguns capítulos e não estava mais a par da história. 
Eis que em um destes lapsos de tempo que temos quando paramos para focar em algo ela se depara com a cena do mocinho abraçando com ternura a mocinha. Pensou ela: - "Bem que eu podia ter um namorado pra me abraçar assim". Mas como um mantra que se invoca em momento de profunda desgraça ela balbucia: - "Homem nenhum presta".
O celular vibra fazendo ela despertar do transe de satã em que se encontrava. Era a amiga solteirona como ela. Ansiosa como criança em crise de asma a amiga mal podia se conter de felicidade. Havia descolado um broto. Tipo assim, não era um namorado mas um ficante estável.
Ela houvia a amiga falando toda feliz e pensava: "Esse negócio de namorado esta me perseguindo".
Feliz a amiga desliga e incomodada ela engole a comida. De súbito levanta e resolve dar uma volta. O de sempre, shopping. No caminho, era casal no ônibus, casal no estacionamento, casal na fila de cinema. Sim o universo conspirava contra o bom humor dela.
Sentada, com mais da metade de um milk shake tomado e se sentindo dez quilos mais gorda lembrou-se do Ricardão. Não aquele das histórias mas um ex namorado seu, meio sacana, meio sem vergonha mas que havia apresentado aquele milk shake que a fazia engordar.
Pensou em ligar, mas demoveu-se da idéia. Antes só do que mal acompanhada e o Ricardão já tinha dado o que tinha que dar. Pensou: "Deus, é o fundo do posso ligar para o Ricardão".
Triste, gorda, sozinha, desamparada e sem amor lá se foi ela para casa quando de repente vê um casal brigando na frente do prédio. Maldade se deliciar com a desgraça dos outros mas ela meio que se sentia vingada. Aquela noite, não seria ela a única pessoa a ir dormir infeliz.
Desesperançada do amor ela entra no elevador e eis que seus olhos se cruzaram com os dele. Não era bonito, mas não era feio também. Ambos tinham a mesma altura e ela logo pensou que de salto ficaria mais alta do que aquele tampinha. Não sabia ao certo o que chamara a atenção naquele rapaz mas de fato algo fazia com que seus olhares se cruzassem. 
Havia chegado o andar dele. E ela na frente da porta. Ele pediu licença e de cabeça baixa saiu. Ela o acompanhou com um olhar de curiosidade. Não lembrava de tê-lo visto por ali antes.
Passaram-se os dias e eles se trombaram mais umas vezes até que uma primeira conversa surgiu.
Ele gostava de ler e curtia rock. Não tinha um elefante com as costas viradas para a porta de entrada mais sim uma estátua de um buda gordo e sorridente. Tantos foram os pontos em comum que logo sorrisos e brincadeiras surgiram. Ao voltar para casa, aquela sensação boa e boba de quem se encanta com alguém surgiu.
Mas não, não podia sentir aquilo afinal de contas homem nenhum prestava. 
Mal humorada, levantou-se pela manhã com cara de quem poderia matar um. Não atendeu as ligações dele durante o dia. 
Estaria fazendo o certo em não atender porque homem nenhum presta, mas na última tentativa dele já no finzinho do dia ela resolveu atender e percebeu o quanto aquele papo a fazia bem. Resolveram. Iam se encontrar num barzinho logo ali próximo. Um rock clássico tocava e o chopp estava na temperatura ideal. Entre sorrisos e olhares o primeiro beijo aconteceu. Ela percebeu que daquele momento em diante não poderia mais ficar sem aquele beijo. Feliz, voltaram para o prédio e no andar dele se despediram. No elevador ela se encolheu num sorriso quase pueril, daqueles de menina sapeca. O amor havia acontecido.

Nenhum comentário: